Dois Josivaldos levantam suspeita no Tigre: quem manda não é o presidente, porque este se resume a passar uma procuração ao xará e dirigir o ônibus do clube
Por GloboEsporte.comJoão Pessoa
No mundo do futebol, não é exatamente uma novidade um clube ficar sem presidente. Por afastamento ou por renúncia ao cargo, é até comum uma agremiação ficar por um tempo sem a figura do dirigente máximo, pelo menos até que se convoquem novas eleições e um novo nome seja conduzido ao cargo. O Atlético de Cajazeiras, por exemplo, vive essa situação após Essuélio Morais abrir espaço para um novo dirigente comandar o clube. Mas ter dois presidentes é algo inusitado. O CSP tem. Um de fato, outro de direito. Um no papel, outro na prática. Um com ares de laranja, outro que manda.
Ambos têm o primeiro nome exatamente igual: Josivaldo. Um é Alves, outro é Gomes. Um é microempresário e faz as vezes de presidente geral do clube. O outro é, efetivamente, dono do cargo, mas, na verdade, faz bico em uma oficina mecânica e tudo o que dirige dentro do clube é o ônibus do time. Uma coincidência no mínimo estranha e que faz a maioria dos envolvidos com o futebol paraibano tratar como presidente do Tigre a "pessoa errada".
À esquerda, o presidente-motorista Josivaldo Gomes; à direita, o microempresário-mandatário Josivaldo Alves(Foto: Reprodução / SporTV)
Vamos aos dois personagens dessa trama. Josivaldo Alves dos Santos é quem todo mundo acha que é, de fato, o presidente do CSP. E ele faz quase tudo o que um presidente de clube faz. É ele quem defende os direitos do clube em reuniões na Federação Paraibana de Futebol (FPF), por exemplo. Acompanha e lidera o time. Participa das negociações, das contratações de integrantes da comissão técnica e de jogadores. Mas oficialmente, dentro do clube, tem o cargo de presidente do conselho deliberativo - e não da diretoria executiva, esta sim a função máxima no Tigre.
- Eu coordeno e agilizo as coisas. Por ter mais vivência no mundo da bola, faço praticamente tudo - resume Josivaldo Alves, deixando claro que são dele as atribuições de presidente.
Do outro lado está Josivaldo Severino Gomes. Esse, poucos sabem quem é. Para não ficar parado, ele faz bico na oficina mecânica do seu irmão. E, quando o clube está envolvido em alguma competição, ele é o motorista que dirige o ônibus do time. Mas é o seu nome que consta nos documentos oficiais como presidente máximo do CSP. É a sua assinatura, em tese, que vale no fim das contas. Mesmo assim, ele transfere uma procuração para o outro Josivaldo e apenas leva e traz os jogadores a treinos e jogos.
- Pego os meninos (jogadores) e levo para o treino. Levo para o almoço. De duas horas, levo para o treino de novo. Volto - revela o presidente Josivaldo Gomes, detalhando qual é exatamente a sua função dentro do clube.
O caso veio à tona há três anos, quando até o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) foi vítima da confusão envolvendo os xarás no comando do CSP. O impasse começou em 2012, quando o Tigre venceu a Copa Paraíba, que dava ao campeão o direito de disputar a Copa do Brasil no ano seguinte. Na ocasião, a competição estadual seria disputada por cinco clubes, mas dois desistiram e, assim, a FPF organizou um triangular - com Botafogo-PB e Treze, além do próprio CSP. O Alviceleste de João Pessoa conquistou o título e se credenciou para representar o Estado na Copa do Brasil de 2013.
Josivaldo Alves é, de fato, presidente do conselho deliberativo do CSP, mas atua como presidente da diretoria executiva (Foto: Reprodução / SporTV)
Mas a CBF não reconheceu a conquista do CSP, já que o Regulamento Específico da Competição (REC) previa que torneios seletivos para a Copa do Brasil só teriam efeito se fossem disputados por pelo menos quatro times. Com isso, o Tigre perdeu a vaga, que foi herdada pelo Sousa, vice-campeão estadual daquele ano.
Revoltados com a retirada do time da competição nacional, os dirigentes alvicelestes recorreram à justiça desportiva para reaver a vaga. Derrotado na esfera desportiva, o clube foi à justiça comum. E aí Josivaldo Alves - o microempresário - fez duras críticas ao STJD, o que acarretou em denúncia e novo julgamento. Josivaldo, então, foi julgado e enquadrado no Artigo 243 F do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), que trata de ofensas contra "alguém em sua honra, por fato relacionado diretamente ao desporto". A punição determinada foi de suspensão por 375 dias e multa de R$ 7 mil. Acontece que os nomes iguais confundiram o STJD, que fez todo o processo contra o verdadeiro presidente do CSP, ou seja, o outro Josivaldo. E, assim, quem cumpriu a pena e ficou suspenso até o ano seguinte foi, na verdade, o Josivaldo Gomes.
Os repórteres Fred Justo, Natan Moreira e Breno Pires, do SporTV, conversaram com os dois Josivaldos, que explicaram exatamente qual o cargo exato de cada um dentro do CSP e qual é a função que exercem. Na sede do clube - no Grotão, comunidade carente de João Pessoa -, Josivaldo Alves negou que o seu xará atue como laranja dentro do Alviceleste e tentou explicar por que o Josivaldo Gomes não participa das decisões da diretoria.
- Ele (Josivaldo Gomes) não vai às reuniões da Federação porque não é a parte dele.
Josivaldo Gomes é quem tem o cargo de presidente da diretoria executiva, mas sua função no clube é dirigir o ônibus do time (Foto: Reprodução / SporTV)
E quando questionando sobre como o Josivaldo Gomes poderia ser o presidente do Tigre sem entender nada de gerenciamento de um clube, o Josivaldo Alves respondeu com outra pergunta e tentou justificar.
- Por que não (o outro Josivaldo ser presidente)? Ele não tem esse entendimento, mas tem o entendimento de ajudar.
Josivaldo Alves também comentou o fato de o seu xará ter sido punido em seu lugar pela crítica feita ao STJD. Segundo o microempresário, ele até estranhou o fato de ter ido ao Rio de Janeiro e apenas em meio ao julgamento ter percebido que a sua pena seria direcionada ao outro Josivaldo.
- Eu só falei que sentia que tinham "forças ocultas" que poderiam ter tirado o direito que o CSP conquistou dentro do campo. Então, quando cheguei no tribunal, vi que o processo era contra o Josivaldo presidente, não contra mim. Mas isto tinha sido dito por mim. Eles pegaram minha identidade na hora e ficaram um pouco confusos - disse.
Enquanto isso, em João Pessoa, o outro Josivaldo nem sabia por que estava sendo julgado.
- Eu não falei nada. Nunca dei entrevista para a imprensa, nem nada. Quem falou foi o outro Josivaldo.
Sobre a condenação ao "presidente errado", o STJD informou que "o tribunal julga com provas produzidas pelas partes e que não procede a informação de que o condenado se tratava de outra pessoa".
Mas a confusão no STJD não foi a única causada pela dupla de Josivaldos. Já nesta temporada, um novo impasse envolvendo os xarás ameaçou, inclusive, paralisar a Série C do Campeonato Brasileiro. O CSP contratou o volante Sapé ainda em 2013. Como o presidente Josivaldo Gomes estava suspenso, quem assinou o contrato do jogador foi Josivaldo Alves, que tinha uma procuração do seu xará. Só que essa procuração só foi apresentada à FPF quase um ano depois da negociação.
Já neste ano, Sapé foi emprestado ao Botafogo-PB e disputou a Série C pelo Alvinegro. América-RN e Remo, então, denunciaram o Belo por ter supostamente usado um jogador irregular na competição. Mas a CBF atestou a regularidade do jogador, e o STJD arquivou o processo. O mesmo STJD que três anos atrás puniu um Josivaldo em lugar do outro.
Presidente do papel, Josivaldo Gomes faz bico na oficina mecânica do irmão (Foto: Reprodução / SporTV)
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